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quarta-feira, 23 de julho de 2014

Camões, Grande Camões, quão semelhante. - Interpretação do poema de Bocage

Queridos leitores e amigos da Rainha, hoje quero fazer a minha interpretação pessoal  de um dos poemas de Manuel Maria Barbosa du Bocage, um poeta controverso na sua época, mas amado por muitos ao longo dos anos.

"Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cortejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo
Arrostar co´o sacrílego gigante;

Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Na penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
também carpindo estou, saudoso amante.

Ludibrio, como tu, da sorte dura
Meu fim demando ao céu pela certeza
De que só terei paz na sepultura.

Modelo meu tu és, mas... oh, tristeza!...
Se te imito nos transes da Ventura,
Não te imito nos dons da Natureza."

Bocage,"Rimas"

Este poema de Bocage é lindíssimo. É uma perfeita homenagem ao grande poeta Luís Vaz de Camões. Conseguem sentir o que o Bocage sentiu ao escrever estas palavras? Se não, acompanhe o meu raciocínio.

Em primeiro lugar, é necessário identificar o tipo de poema que temos à nossa frente. Este poema é um soneto, por que? Porque tem duas quadras e dois tercetos. (Cada linha é um verso. O nome dado ao conjunto de 4 versos é: quadra. O nome dado ao conjunto de 3 versos é: terceto.)

Agora que já identificámos o tipo de poema, podemos começar a interpretar cada uma das 4 estrofes individualmente.

Primeira estrofe:

"Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cortejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo
Arrostar co´o sacrílego gigante;"

Que palavras não entende nesta quadra? Eu ajudo.

Semelhante = parecido, idêntico, da mesma natureza
Fado = destino
Arrostar = enfrentar sem medo
Sacrílego = profanação, ultraje, impiedade
Gigante = Adamastor 

Nestes versos, Bocage mostra bem o seu sentimento de pequenez, comparando a sua escrita com o talento do próprio Camões. No entanto ele achava que eram bastante semelhantes devido ao facto de terem os mesmos gostos e por serem ambos Portugueses, conhecendo os mesmos lugares como o rio Tejo, por exemplo, lugares que serviram de inspiração para os dois poetas.

Além disso, lembram-se da história do Adamastor? Aquele monstro que vivia no cabo das tormentas (mais tarde, chamado de Cabo da boa Esperança) a atormentar os barcos que se aproximavam, cujo destino era a Índia? É desse personagem que o Bocage fala. Disse Bocage, que Luís de Camões era corajoso, pois enfrentava esse gigante sem medo. Aqui é usada uma metáfora pois, era na arte de poetizar que o Camões não tinha medo.

Segunda estrofe:

"Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Na penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
também carpindo estou, saudoso amante."

Ganges = É um rio que se situa na Índia
Penúria = Miséria
Carpindo = chorar, lamentar-se

Lá está outra vez, o Bocage, a falar sobre os descobrimentos. O Rio Ganges é um dos principais rios da Índia. Provavelmente Camões atravessou esse rio. Camões e Bocage choravam por que motivo? Por causa da miséria que existia em Portugal naquela época.

Terceira estrofe: 

"Ludibrio, como tu, da sorte dura
Meu fim demando ao céu pela certeza
De que só terei paz na sepultura."

Que palavras não entende neste terceto? Eu ajudo.

Ludibrio = Engano
Demando = reclamar, disputar, exigir

Bocage reclamava dos enganos, provavelmente dos enganos políticos da época. E devido à pobreza em que vivia queria reclamar até morrer. Ele sabia que só teria paz quando morresse.

Quarta estrofe:

"Modelo meu tu és, mas... oh, tristeza!...
Se te imito nos transes da Ventura,
Não te imito nos dons da Natureza."

Transes = Agonia, angústia, aflição, 
Ventura = Sorte, destino, acaso, risco

O poeta achava que Camões era o seu modelo na poesia. Mas ao mesmo tempo tinha noção da sua pequenez enquanto poeta. Segundo Bocage, tanto ele como Camões sofriam dos mesmos males na sociedade em que viviam, no entanto Bocage sentia que não chegava aos calcanhares de Camões na arte da escrita. 

Estaria Bocage realmente certo? Ou estamos perante estilos diferentes de fazer poesia?Qual a sua opinião, caro leitor?

2 comentários:

Anónimo disse...

Pessoalmente a minha interpretação do poema é ligeiramente diferente começando pela primeira estrofe Bocage diz que o destino dele e de Camões é idêntico a referência ao Tejo para mim significa que ambos saíram do mesmo porto rumo à India

Jovita Capitão disse...

E é possível que assim seja. Um poema pode ter variadíssimas interpretações. :)Obrigada pela sua opinião sobre o assunto!